Morte Viva

Há uma semana estava escrevendo sobre dois filmes nacionais quando a TV me surpreendeu com uma notícia: A morte de Paulo Autran, um dos atores de maior reconhecimento, ressaltando a antológica participação como protagonista da obra prima do Cinema Novo, Terra em Transe(Glauber Rocha), significa a perpetuação e a renovação dos talentos cênicos nacionais. Digo isso porque vejo uma nova constelação de atores com sensibilidade e técnica suficientes para fazer jus ao sucedido legado artístico do Autran em vida.
Em sua última aparição no Prêmio Bravo de cultura, em que foi homenageado, o fez como um “grand finale”. O recebimento de mais um prêmio dentre tantos em sua carreira, dessa vez teve um sabor especial, de missão cumprida, abrindo assim, os caminhos para estrelar o hall da fama dos céus...
E assistir da platéia o que os Novos têm para mostrar.

O olhar é a luz que sai do olho... disse Zé. Como é que pode tanta coisa nesse mundo que nunca foi vista antes estar bem debaixo do nariz? Bem se diz que o ser humano só vê aquilo que quer enxergar... é essa coisa de opinião formada, a cegueira do preconceito e a preguiça de mudar.
Na vida existem coisas que acontecem e independem de nós e outras sobre as quais temos o dever e obrigação de agir. Como no rumo de uma viagem em que o objetivo aparente é apenas chegar ao local de destino por razões involuntárias, mas no final das contas o que se faz valer é o trajeto, como os caminhos foram traçados por cada um encontrando assim o remédio certo para o motivo de tal partida.
Os áridos percursos de Jonas e Ranulpho podem se cruzar mesmo com o paradoxo entre regresso e fuga. Estou falando de Árido Movie e Cinemas, Aspirinas e Urubus... metafóricas palavras para se conseguir enxergar e silenciosos olhares para se dizer com ou sem metáforas?! A confusão reina mesmo entre esses personagens. O retorno às raízes indesejadas de Jonas, metropolitano homem do tempo, nem sempre tão previsível em suas atitudes, faz da estrada ressecada e da pressa um bom motivo para entrar no carro de uma estranha, ouvir dizeres dos quais não tinha o menor interesse e que serviram como molde para lapidar a sua pedra bruta.
Brutalidade era o que não faltava no sertanejo Ranulpho que ao fugir da sua guerra nordestina pega carona com um desertor vendedor de aspirinas. Possuidor do escapismo tecnológico da imagem em movimento, Johann vendia a cura para as dores e distribuia uma amostra grátis da sua vida, contrariando a natureza suicida alemã em tempos de guerra, com um discurso encorajador sobre alcançar a felicidade ou coisa parecida.
Então eu volto ao ponto de que nem tudo é necessário que seja dito para ser percebido em condições normais de temperatura e visão. A sutileza (palavra que ouvi bastante por esses dias) ao simular uma disputa verbal entre dois cabras por uma mulher, com apenas olhares intercalados para o alvo cobiçado diz tanto quanto uma guerra simbólica entre dois povos resumidos a Johann Vs. Ranulpho, sem precisar de um único disparo.
Eis uma questão de entendimento. Diálogos profundos podem ser tão complexos quanto silenciosas cenas de pura expressão corporal... torna-se indispensável o exercício do pensar.


3 comentários:

Mari Ferreira disse...

seu texto tá perfeito!
muito lindo como um texto e um tema casou com outro texto e o outro tema,sendo estes aparentemente tão distintos!
Me sinto feliz e orgulhoso ao ver ess tipo de genialidade numa pessoa que admiro..

Parabéns!

Guto Amorim disse...

Então...confirmamos assim a dona da coluna de cultura da nova versão do ASP...que está por vir...

Luã Vaz disse...

sem palavras, ao mesmo tempo que assimilava já me era silenciado por uma bateria de novas informações as quais me faltam um pouco de base, mas o suficiente para tentar entender o que eu acho que você quis expressar, independente de minha visão limitada seu texto esta quase divino.